A pandemia de COVID-19 está a atrasar a convergência das economias africanas com o resto do mundo. Em 2022, projeta-se que o crescimento económico africano seja um ponto percentual abaixo da taxa mundial de 4.9 %. Segundo as projeções atuais, os países africanos demorarão mais de cinco anos a recuperar a sua quota-parte pré-COVID (cerca de 5 %) do produto interno bruto (PIB) mundial. A procura mundial mais fraca de mercadorias, as perturbações da cadeia de abastecimento e as medidas sanitárias necessárias têm restringido a capacidade de produção de África. A nossa análise de 127 polos industriais africanos, baseada na intensidade da luz noturna, sugere que as suas atividades diminuíram até 7.2 % entre março e agosto de 2020. O ritmo lento da vacinação contra a COVID-19 retém a recuperação. Em dezembro de 2021, apenas 7.7 % da população africana tinha recebido uma vacina, contra 69.5 % nos países de rendimento elevado.
Acelerar a transformação produtiva de África é uma prioridade política para a recuperação económica. A crise económica está a dificultar o desenvolvimento do continente, empurrando mais de 29 milhões de pessoas para a pobreza extrema. A criação de emprego produtivo pode ajudar a diminuir os níveis de pobreza, uma vez que a margem orçamental limitada e a economia informal predominante diminuem o âmbito e a eficiência dos sistemas de proteção social. A nossa previsão para dez países africanos com dados de alta frequência indica que uma forte recuperação mundial poderia aumentar o seu crescimento do PIB para quase quatro pontos percentuais acima do nível atingido no segundo trimestre de 2020. No entanto, esta previsão depende da capacidade local para retomar a produção. Dados bilaterais mensais sobre o comércio sugerem que as exportações africanas se situam atrás de outras regiões do mundo. A participação do continente nas importações totais dos mercados da União Europeia e dos Estados Unidos diminuiu de 2.4 % em 2019 para 2.0 % em 2020, enquanto a participação da América Latina e Caraíbas (ALC) aumentou ligeiramente.
A entrada em vigor da Zona de Comércio Livre Continental Africana (ZCLCA), em janeiro de 2021, cria novas oportunidades para acelerar a transformação produtiva através do desenvolvimento de redes de produção regionais. A produção regional de produtos transformados ou semitransformados tem um elevado potencial de crescimento, uma vez que representa apenas 2.7 % da participação de África nas cadeias de valor globais. O fomento da produção regional pode ajudar os países africanos a diversificarem a sua base económica e a melhorarem a produção. Em 2019, os bens transformados e semitransformados representaram 79 % das exportações intra-africanas, contra 41 % das exportações africanas para outros destinos. O aumento da produção regional pode também criar mais empregos de qualidade. Nas cadeias de valor agroalimentar, os postos de trabalho em segmentos a montante, como a transformação alimentar, a comercialização, os transportes e o comércio a retalho, geram até oito vezes mais produção por trabalhador do que os postos de trabalho na agricultura. Para indústrias de grande escala, como a indústria automóvel, a ZCLCA pode facilitar um modelo hub-and-spoke (distribuição radial) de vários centros de montagem regionais e fornecedores de componentes.
A cooperação regional é fundamental para superar os desafios e riscos na construção de redes de produção regionais na ZCLCA. Desde 2012, os custos do comércio intra-africano aumentaram para os níveis de 2007 devido a fatores como barreiras não pautais, infraestruturas de transporte insuficientes e fracos serviços relacionados com o comércio. Atrair empresas líderes e ajudá-las a operar além-fronteiras exige o reforço das instituições formais e informais. Muitas empresas africanas enfrentam desafios para a internacionalização e formação de laços com empresas líderes. A cooperação regional pode ajudar a enfrentar simultaneamente múltiplos riscos através da produção transfronteiriça. O aumento dos riscos ambientais também precisa de ser abordado. Este relatório mostra que, apesar de um desenvolvimento industrial limitado, o número de mortes causadas pela poluição atmosférica exterior em África ultrapassou em 30 % o valor mundial e em 50 % o valor da China no período 2010-19. Adotar o modelo de desenvolvimento “industrializar primeiro e limpar mais tarde” de outras regiões do mundo teria custos económicos sem precedentes para África.
Novas políticas de apoio às redes de produção regionais podem beneficiar de muitas lições retiradas de políticas passadas e de novas tendências emergentes. Os choques da COVID-19 tiveram consequências significativas e diversas no comércio e na produção a nível mundial. Por exemplo, o investimento direto estrangeiro greenfield em África diminuiu em 2020-21 em todos os setores, exceto nas tecnologias da informação e comunicação e nas indústrias da Internet, onde mais do que duplicou entre 2015 e 2021. Em retrospetiva, importantes lacunas na implementação de políticas e a falta de mobilização de recursos prejudicaram as políticas passadas. Neste contexto, emergem duas áreas políticas fundamentais:
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A digitalização do comércio e da produção intra-africanos exige uma colaboração mais estreita entre os setores público e privado. Várias inovações digitais melhoram a eficiência da logística, das alfândegas e das finanças. Oferecem novas oportunidades aos produtores mais pequenos e informais. Os decisores políticos podem ajudar a aumentar a escala das soluções impulsionadas pelo setor privado. Podem facilitar a coordenação entre as partes interessadas, harmonizar a regulamentação e as normas entre setores e países e modernizar as administrações aduaneiras. As alianças público-privadas são fundamentais para o desenvolvimento de infraestruturas regionais de Internet e para a criação de regulamentos acomodatícios para os fluxos transfronteiriços de dados. Em 2020, a largura de banda intrarregional como parte da largura de banda total da Internet atingiu 16 % em África, em comparação com 20 % na América Latina e Caraíbas, 56 % na Ásia e 75 % na Europa. Apesar dos progressos realizados, é necessário mais investimento para alcançar os países de rendimento elevado.
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Os governos africanos devem adaptar as suas estratégias nacionais de industrialização ao novo ambiente proporcionado pela ZCLCA. Em primeiro lugar, o apoio à mobilidade intrarregional de competências e o desenvolvimento de centros de formação regionais podem atenuar a escassez de competências. Em segundo lugar, os governos podem combinar esforços para melhorar as infraestruturas e promover o investimento nos corredores de desenvolvimento, nomeadamente através da implantação de projetos de infraestruturas multimodais no âmbito do Plano de Ação Prioritário 2021-2030 do Programa de Desenvolvimento de Infraestruturas em África (PIDA PAP 2). Em terceiro lugar, uma forte estrutura de acompanhamento pode ajudar a implementar o Quadro Pan-Africano de Investimento nos países membros. Em quarto lugar, os contratos públicos podem alargar os critérios de elegibilidade para o tratamento preferencial aos produtores da ZCLCA. Esta abordagem pode criar procura para a produção regional de bens e melhorar a qualidade dos contratos públicos, que se situam em 8.7 % do PIB em África, em comparação com 8 % na Ásia em desenvolvimento e 6 % na América Latina e Caraíbas.